Caos Infinito RPG: Gênese do Sistema Genérico D6 - Do Dark Fantasy ao Cyberpunk

Lobisomem Bárbaro e Ladrão Cyberpunk lutam contra Vampira-Feiticeira, Esqueletos e Robô Assassino em cenário de Dark Fantasy e Cyberpunk.

A Brisa que Anuncia a Tempestade: O Fim do Experimento e o Chamado da Criação

Passado um mês e meio debruçado sobre a rica mitologia de Avatar: A Lenda de Aang, o ciclo se fechava. A experiência de desenvolver um mini-RPG experimental para aquele cenário, conforme relatei no post anterior [https://www.eder.blog.br/2025/11/mini-rpg-avatar-lenda-aang-gurps-3det-cataclismo.html], não era apenas um exercício de adaptação; era um teste de forja. Eu estava lendo, jogando e testando as fronteiras de sistemas consolidados, buscando uma alquimia mecânica que pudesse capturar a fluidez e a letalidade que imagino para a minha própria saga.

Ao invés de buscar a fusão de sistemas existentes, o laboratório criativo me impulsionou para um caminho mais ambicioso: forjar meu próprio sistema de RPG.

Foi um chamado nostálgico. Para iniciar esta jornada, precisei acender a lareira da memória e resgatar os cadernos empoeirados da minha adolescência. Naquela época, sem ter a menor ideia da engenharia por trás do Game Design, eu misturava conceitos de forma pura e instintiva. Lembro-me de combinar o senso de deckbuilding de jogos de cartas com a estratégia de posicionamento de tabuleiro, e as ideias que eu garimpava nas revistas de video game (já que não os tinha) eram transformadas em mecânicas rústicas, mas distintamente minhas. Aqueles mini-sistemas adolescentes eram uma miscelânea caótica de paixões.

É com esse ar nostálgico, mas com alguma bagagem adicional com o desenvolvimento de jogos eletrônicos e teorias de design que comecei a esculpir a base do que viria a ser o Caos Infinito.

A Complexidade do Simples: As Premissas Norteadoras do Caos

Eu gosto do GURPS. Gosto das possibilidades infinitas que um sistema verdadeiramente genérico oferece. GURPS é uma verdadeira enciclopédia de regras, que podem ser adaptadas para cenários distintos, mas que exige do mestre um vasto esforço de adaptação. Por outro lado, sistemas mais simples como Dungeons & Dragons (D&D) acabam incorrendo em outro problema: a multiplicação de subsistemas. O RPG de mesa, para mim, deve ser uma porta aberta para a imaginação, e não um portão de ferro trancado por centenas de regras de exceção.

Refiro-me, por exemplo, à necessidade de o Mestre e os jogadores aprenderem mini-mecânicas distintas para realizar a mesma coisa, como usar magia, apenas porque a classe do personagem é diferente. Se a narrativa exige um contexto diferente para lançar um feitiço — um xamã contra um mago de academia —, a mecânica de resolução de ação não precisa ser diferente. A essência do meu projeto é evitar essa morosidade.

O objetivo era claro: construir uma ponte entre a universalidade do GURPS e a velocidade necessária para o mundo moderno.

1. O Culto ao D6: Acessibilidade e Volatilidade

A primeira decisão foi ritualística: o sistema deve usar dados de 6 lados (D6).

O D6 estava em todo jogo de tabuleiro, sendo acessível e barato. Homenagear o D6 é garantir que o Caos Infinito seja um RPG para todos, do veterano ao novato. Essa escolha não é só sobre acessibilidade e nostalgia, mas também sobre a volatilidade dos valores usados para a resolução de ações. A mecânica de evolução que estou desenvolvendo (e que detalharei em um post futuro) é desafiadora, e os D6s são fundamentais para manter essa tensão. O mestre terá a liberdade de usar outros dados, claro, mas a espinha dorsal mecânica reside no cubo de seis faces.

2. A Universalidade Dinâmica: Genérico sem Ser Travado

O sistema precisava ser genérico, mas de uma forma que permitisse a transição fluida entre gêneros. O Caos Infinito deve ser um espelho: refletir o cenário que lhe é apresentado, sem exigir o esforço simulacionista de um sistema complexo. A dinâmica deve prevalecer sobre a complexidade.

3. O Cenário Oficial: Cataclismo, o Laboratório Vivo

O cenário oficial será a minha saga Cataclismo. Por quê? É o meu laboratório de testes perfeito. O universo de Cataclismo é vasto e caótico, permitindo testar a universalidade do sistema em uma única ambientação.

Neste universo, há: humanos (como a etnia Suna Mandís), outras espécies humanas (como os Itã), espíritos, alienígenas, dinossauros e criaturas da mega-fauna. E tudo isso com variados níveis de tecnologia, desde espadas rústicas até armas de laser, de carroças e navios à vela até espaçonaves ultratecnológicas. É o ambiente ideal para garantir que o sistema possa suportar desde uma fantasia clássica até um cyberpunk distópico.

A verdadeira prova do seu escopo, no entanto, reside na capacidade de hibridização de gêneros. Por exemplo, a minha filha Diana lançou recentemente uma ideia que amei e que me mostrou o potencial real do Caos Infinito para novos cenários: usar o sistema para explorar o folclore sombrio do Brasil, mesclando-o com o gênero de fantasia urbana. Imagine uma aventura onde os jogadores enfrentam a Mula Sem Cabeça ou o Curupira em meio aos arranha-céus de uma metrópole moderna ou nas paisagens rurais do nosso vasto território, tudo com a mesma fluidez mecânica vista em Cataclismo. É a prova de que o sistema é mais do que dark fantasy – ele é uma ferramenta para desenterrar o terror e a aventura de qualquer cultura.

4. A Alquimia da Criação: O RPG Procedural

O Sistema de RPG Procedural é um conceito emprestado do desenvolvimento de jogos eletrônicos. Significa que o sistema fornece "algoritmos" claros que apoiam Mestres e jogadores no desenvolvimento das aventuras/campanhas.

Em vez de centenas de páginas de regras fixas para exceções, o Mestre deve ser capaz de gerar conteúdo (aventuras, NPCs, dungeons) usando a combinação de modelos e tabelas simples. Isso libera o Mestre para se concentrar na narração, garantindo que o Caos no mundo seja ordenado por regras transparentes.

Esculpindo os Pilares: A Engenharia do Caos Infinito

Com as premissas estabelecidas, comecei a desenhar os pilares centrais que sustentariam essa nova mecânica.

I. A Criação de Personagens: A Distinção Inata

O sistema permitirá que o personagem inicial já nasça com distinções específicas e coerentes à sua raça, profissão e experiência. O objetivo é criar personagens únicos sem precisar usar tabelas e regras fixas por raças e classes, garantindo que a ficha reflita a sua história de forma equilibrada e sem amarras narrativas.

II. O Combate: Rápido, Estratégico e Letal

O coração de um RPG de aventura é o combate. O desafio era unificar o "teatro da mente" com a estratégia tática, mantendo a velocidade.

Imagine um herói como John Wick, transportado para uma fantasia medieval genérica, enfrentando um grupo de cinco orcs. No Caos Infinito, essa cena deve se resolver em apenas dois ou três turnos, com uma sucessão de ações estratégicas de alta precisão. O alto dano de um disparo seria conseguido não por um valor fixo, mas devido ao treinamento de Wick com armas de disparo, aliado à sua mira certeira. Por outro lado, um crocodilo de 10 metros de comprimento deve ter a capacidade de eliminar um jogador ousado demais em dois turnos. O sistema busca ser dinâmico o suficiente para não frear a narrativa, mas letal o suficiente para que o perigo seja real.

III. A Mecânica Unificada: Uma Linguagem para o Caos

A terceira grande meta era a unificação das ações especiais. Habilidades mágicas, tecnológicas, artes marciais, conhecimento de explosivos ou tiro de precisão — tudo utiliza uma mesma mecânica base que facilita o aprendizado e a fluidez do jogo. A diferença reside na descrição narrativa e no tipo de Efeito Especial que a Perícia concede, e não em regras de exceção complicadas.

IV. A Evolução Desafiadora: Impedindo o "Mais um Dia"

Sabe aquele problema de jogadores que já estão muito evoluídos e para os quais um Dragão de Cinco Cabeças se torna apenas "mais um dia para a trupe dos obliteradores de monstros"?

No Caos Infinito, isso não deve acontecer. Inspirado em jogos de RPG e Sobrevivência, pensei em uma mecânica que limita o poder bruto dos jogadores. A evolução em termos de Atributos Primários e Vitalidade é limitada a um valor de XP FIXO. Após atingir esse ápice, o personagem não pode mais crescer em poder puro. Contudo, ele pode e deve continuar ganhando XP para aprender mais Conhecimentos (Perícias de utilidade, estratégias, habilidades únicas) que lhe permitem usar seu poder limitado de formas mais criativas e estratégicas. Com isso, o desafio de um monstro lendário sempre manterá a emoção do perigo. Claro que Mestre e jogadores podem desobedecer essa regra, mas é desaconselhado para que a emoção do desafio não se restrinja apenas a "coisas grandiosas demais".

V. Geradores Procedurais: O ATLAS e o Micro-Conteúdo

Os pilares finais são as ferramentas do Mestre: o Gerador Procedural de Mini-Cenários (carinhosamente chamado de ATLAS), que serve para apoiar o Mestre na criação de novos cenários, de dungeons a impérios. Seu uso é opcional, mas garante que o Mestre possa ter um palco de aventura coerente e pronto em minutos.

O Lema: Acelerando o Passo no Mundo Moderno

O lema que guiará todo o desenvolvimento do Caos Infinito é:

Ser um RPG de mesa rápido de aprender e começar a jogar, com aventuras mais dinâmicas, para pessoas que têm pouco tempo em um mundo corrido e cheio de distrações.

Esta primeira semana de trabalho se concentrou em definir estes pilares. Na resolução de ações, por exemplo, o sistema inicial optou por um Pool de Soma simples, mas as melhorias recentes nos levaram a uma mescla mais robusta: Pool de Soma mais modificadores (nível do atributo + talento + equipamento). Embora o coração da mecânica esteja maduro, ainda não é hora de divulgar os detalhes exatos das regras. O sistema está longe de ser concluído; o ATLAS, por exemplo, precisa de revisões e está ainda pela metade.

Meu hobby como Game Designer e minha experiência com RPG de mesa na infância e adolescência e meu interesse por mecânicas de jogos (além da minha formação técnica em computação, claro) me deram a base para entender o que funciona e como pensar em algoritmos para resolver os problemas que a minha própria ousadia traz para o projeto. O Caos Infinito vai ser a prova disso. Nas próximas semanas, continuarei detalhando a construção do sistema.


 

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