Minha jornada até os Kettlebells.

Eu carregando meus Kettlebells

Desde pequeno eu sempre gostei de atividades físicas - qual criança não gosta? -, mas nunca me destaquei em nenhum esporte e nunca pratiquei nenhum oficialmente. Dentre todos eles, os que mais gostava quando garoto eram os esportes relacionados à lutas, em especial o kung fu.
 
Desde pequeno eu sempre me exercitei em casa, fosse imitando exercícios que via na TV, ou sobre os quais eu havia lido em revistas ou fosse ajudando meu pai de vez em quando - que por exercer a profissão de pedreiro, me proporcionou o cenário ideal para treinar e muito a minha força de uma forma funcional - embora na época eu não fizesse a menor ideal do que é treino funcional.
 
Já maior e um pouco mais velho (na época em que comece a cursar a faculdade e trabalhar na empresa em que sou registrado até os dias atuais) eu fiquei sem tempo nenhum para praticar absolutamente nada. Isto foi por volta de 2004 a 2005.
 
Foi neste cenário de dividir o dia em trabalhar sentado das 8 da manhã às 18 da tarde e depois ficar das 19 horas da noite até 23 também sentado estudando Ciência da Computação, que as dores nas costas - que desde cedo apareciam fracamente ora ou outra - mostraram as caras de vez e, após ir a uma consulta médica (em que eu fui diagnosticado erroneamente com uma simples luxação) eu resolvi procurar um jeito de me exercitar novamente, pois isto não só espantava a minha dor (consideravelmente pelo menos) como também funcionava como um remédio para manter o meu "monstro" dormindo enquanto o meu "médico" se apresentava à sociedade (sim, eu costumo - ainda hoje - ser bem ranzinza quando não pratico atividades físicas por muito tempo).
 
Mas como e principalmente quando eu me exercitaria? E começaram meus testes malucos...
 
Tentei carregar uma mochila com pesos dentro para poder treinar bíceps enquanto esperava o ônibus (pensando nisso agora, percebe porque muitas pessoas me acham meio maluco, kkk). Tentei também chegar mais cedo no ponto de ônibus e, enquanto aguardava o fretado, eu corria... Sim eu saia correndo e dava algumas voltas no quarteirão antes do fretado passar. Alguns meses depois eu resolvia ir treinar depois que chegava da faculdade; fazia alguns exercícios como flexão de braço, agachamento, levantamento de peso, etc...
 
Mas essas maluquices não deram certo na época.
 
Foi então que vi, certa manhã enquanto aguardava o tal fretado, um senhor de meia idade indo para o serviço de bicicleta. Eu via lâmpada acendendo em minha cabeça e o eco de meu pensamento dizendo "como não pensei nisso antes?".
 
E foi assim que durante o resto da faculdade eu passaria a me exercitar basicamente na bicicleta. As dores nas minhas costas deram uma melhorada, mas não sumiram. Pelo contrário, a despeito do exercício que aliviava a dor por um tempo, eu percebi que o problema parecia crônico e tornei ao ortopedista e desta vez não aceitaria o "é só uma luxação como diagnóstico".
 
Isto foi quando eu já estava concluindo a faculdade, em 2009. Ainda andava de bicicleta, mas já estava começando a me interessar por boxe. Já estava usando um saco de pancadas e um par de luvas emprestadas para ensaiar os primeiros treinos.
 
Para a minha infelicidade o diagnóstico foi pior do que eu esperava; eu tinha uma escoliose, uma torção lateral na coluna e que era estrutural, ou seja, nem mesmo com exercícios de RPG eu corrigiria o problema. Apesar de não ser uma escoliose tão perceptível, já era mais que suficiente para ocasionar as dores que tanto me incomodavam.
 
Mas o pior de tudo foi ouvir; ao questionar o ortopedista que me atendeu (já um senhor de idade) o que eu poderia fazer para melhorar as minhas dores, que eu deveria evitar todo e qualquer tipo de impacto, desde corrida (boxe nem pensar), levantamento de peso, etc. Questionei sobre a bicicleta e ele me disse que este exercício não me ajudaria, bem como não me atrapalharia; as dores simplesmente permaneceriam. O mais indicado para mim, segundo ele, era praticar hidroginástica.
 
Saí do consultório ao mesmo tempo irritado e arrasado.
 
Foi aí que o "médico" saiu de cena e o meu querido "monstro" assumiu o comando. Comecei a praticar boxe e segui com meus treinos por um ano e meio. Para minha surpresa, após o ato rebelde e inconsequente de desobedecer as ordens médicas, a minha coluna dava sinais de grande melhora. Eu ainda sentia dor, mas era em torno de uns 80%  menos do que na época em que eu não praticava exercícios.
 
Intrigado, fui ler a respeito e percebi que este resultado tinha relação com o fortalecimento do meu Core. O Boxe é um esporte que prioriza muito o preparo físico e treina muito a musculatura estabilizadora (simplificando o tal do Core) para que o atleta suporte as pancadas. Como eu não iria mesmo praticar boxe como profissional e nem sair dando ou recebendo porradas, percebi que não havia muito com o que me preocupar, a despeito da proibição total que o médico me fizera a respeito de esportes de impacto. Foi ali que senti na própria pele que os médicos não sabem de tudo; a medicina não é uma ciência exata assim como, aliás, nenhuma ciência o é.
 
Mas eu ainda tinha minhas dúvidas; não possuía, afinal, bagagem suficiente para desconsiderar completamente aquela proibição.
 
Foi então que me mudei para o apartamento em que moro atualmente (o mais correto seria dizer apertamento). E lá se foi o meu espaço para o saco de pancadas. Fiquei parado alguns meses, pensando em alguma logística que me permitisse tornar aos treinos.
 
Resolvi voltar a bicicleta para ir trabalhar e fiquei mais alguns anos só praticando essa atividade física e alguns exercícios com peso dentro do apartamento mesmo. Eu também não tinha muito mais tempo para pensar em começar a frequentar uma academia, pois minha filha ainda era bebê e eu queria passar o máximo de tempo possível com ela e com minha esposa.
 
Mas, já alguns anos mais velho (não muitos, mas o suficiente), comecei a perceber que só a bicicleta e os exercícios de musculação não estavam dando resultado. Às vezes eu até preferia evitar alguns destes exercícios com halter e anilhas, pois sentia que minhas dores pioravam após as sessões de treino.
 
Com o passar do tempo as dores passaram pouco a pouco a me desesperar, pios sentia que elas estavam começando a me impedir de realizar minhas atividades físicas e, sem elas, eu me tornaria um "monstro" ranzinza pelo resto da vida, kkk. Bom, brincadeiras à parte, foi mesmo muito ruim ter esta sensação de que, afinal, eu não poderia fazer uma das coisas que eu mais gostava de fazer e que tão bem fazia para a minha cabeça.
 
Já sem alternativa, procurei uma academia de boxe em uma cidade vizinha (ela era relativamente próximo, pois eu morava na divisa com esta cidade). Fiquei ali um curto período de tempo; apenas 3 meses.
 
Mas, neste curto espaço de tempo eu percebi que minhas dores diminuíram novamente e eis que tive um fiasco de luz enviado a mim pela Esperança em pessoa, pois, afinal, o fato não é que eu não poderia treinar absolutamente nada, mas de fato alguns exercícios não me faziam tão bem.
 
Estudei (por conta própria) este meu problema e a relação dos exercícios indicados para o meu caso.
 
A bicicleta não era de fato um modalidade ruim, mas como eu andava muito todos os dias e como tenho o metabolismo acelerado, eu não aumentava e nem fortalecia a musculatura necessária para estabilizar a região da coluna em que minha escoliose se apresenta. Deste modo e resumindo, a bicicleta levava embora os músculos de que eu precisaria lançar mão para manter minha coluna estável.
 
Os exercícios com halter e anilhas (levantamentos de peso básicos) não eram ruins por si mesmos, mas como em alguns movimentos eu sobrecarregava o lado "torto" da minha coluna, eu só poderia executá-los com a instrução de um profissional da área (e nas academias próximas de casa eu não encontraria nenhum).
 
Infelizmente; por um lado, o período na academia de boxe foi curto, pois tive a infelicidade de ficar com começo de pneumonia no final de dezembro de 2013 e, após o período de afastamento que minha médica me recomendou (10 dias) a academia entrara de férias e, com isso eu posterguei minha volta até que um dia eu declarei que não voltaria mais mesmo.
 
Mas não por menos. O período em que deixei de ir à academia e estudei um pouco mais a fundo o meu problema eu descobri, navegando na internet, um tal de Kettlebell.
 
Mas o que viria a ser um Kettlebell? Bom, poucas pessoas conhecem a ferramenta no Brasil (embora seu uso esteja se espalhando dia após dia) e não há muitos lugares em que se possa treinar com um Kettlebell nas academias daqui e mesmo aquelas que possuem a peça à utilizam como mais uma ferramenta para aulas em circuito, como no crossfit (em que várias ferramentas são utilizadas para trabalhar o condicionamento físico). Trata-se de um espécie de bola de ferro com uma alça (alguns diriam até que se parece com uma bala de canhão com uma alça ou com uma chaleira, de onde, aliás, vem o nome americanizado da peça) e que eram utilizados na antiga Rússia (por volta de 1700) como contra-pesos de balança.
 
Naquela época remota os russos utilizavam estes contrapesos para demonstrarem sua força, habilidade e equilíbrio em feiras livres; os homens mais fortes daquela época eram chamados, inclusive, de Girevik, termo que deriva do nome russo para Kettlebell; Gyria. Com o passar dos anos o Kettlebell viria a ser nomeado o esporte nacional naquele país e cuja pratica é incentivada pelo governo a fim de manter a população forte e saudável, diminuir os gastos com saúde pública e aumentar a produtividade do trabalhador braçal.
 
E porque deixei a academia de lado após conhecer o Kettlebell? Ocorre que esta ferramenta viria a se tornar minha principal atividade física, pois, ao mesmo tempo em que não ocasiona impacto na coluna (isso não é regra geral e depende do tipo de lesão que cada um possui, logo é bom estudar o caso antes de iniciar a pratica) o Kettlebell permite trabalhar força, aumentar e preservar a musculatura, além de ser cardiorrespiratório.
 
Na verdade não foi uma mudança de modalidade assim tão repentina. Estudei a ferramenta nos primeiros meses de 2014 ao mesmo tempo em que marquei vários retornos com o ortopedista, fiz uma ressonância da coluna e por fim, só me dei por vencido quando escutei no final daquele ano de um ortopedista (o último com o qual me consultei) que eu não só estava liberado para as atividades físicas como eu tinha a obrigação de realizar a pratica de exercícios para manter a minha coluna estável e impedir que ela piore com o avançar dos anos.
 
Lembro-me como se fosse hoje; saí do consultório quase dando pulos de alegria em uma manhã ensolarada de sol, já ansioso por trocar um Kettlebel de anilhas (que comprei para testar a ferramenta enquanto eu não tinha absoluta certeza se a coisa toda correria conforme meus planos) por um Kettlebell Pro Grade de 16 quilos.
 
E desde aquele final de 2014 até os dias de hoje venho praticando exercícios com esta fabulosa peça do mundo antigo. Às vezes realizo alguns exercícios do que se chama Hard Style (difundido no ocidente nos anos 2000 por Pavel TsaTsouline; ex-membro das forças especias Russas), mas o que mais gosto de treinar são os exercícios do próprio Girevoy Sport; pois permitem menos sobrecarga em minha coluna ao mesmo tempo em que me permitem alcançar um alto nível de atividade física em pouco tempo.
 
Além de tudo, como se não bastasse, não é preciso muito espaço para utilizar esta ferramenta e também não considero o aprendizado de seus exercícios. Mas recomendo fortemente (a quem possa a vir se interessar) em procurar ajuda especializada para terem os primeiros contatos com a ferramenta. Eu não me considero um grande praticante e conheço as minhas limitações técnicas, além do que, como sempre estive envolvido com atividades físicas sei reconhecer e aprender bem o que funciona, o que não funciona e se estou fazendo algo errado, mas, a despeito de tudo isso, ainda pretendo realizar algum WorkShop com algum profissional certificado de Kettlebell, mas no momento outros projetos não me permitem dispor do tempo e do investimento necessários para isso. Além do que, na cidade em que moro; Osasco, ainda não há nenhuma referência na área e não é viável para mim me deslocar para outras cidades. Mas é certo que, quando o momento se apresentar - e eu fizer este momento se concretizar - vou buscar diretamente com estes profissionais uma avaliação para melhorar ainda mais a minha prática, à qual pretendo levar para o resto da vida e inclusive, ensinar para a minha filha.
 
E foi assim que descobri e mergulhei nesta modalidade esportiva, nascida em tempos medievais - há quem diga que ferramentas parecidas com o Kettlebell já existiam na Grécia antiga, mas sobre isto nada posso afirmar - e que ainda são muito uteis na atualidade, como uma arma para combater a fraqueza e como meio pelo qual os guerreiros da atualidade podem se preparar para as suas lutas diárias.
 
Futuramente voltarei a falar algumas coisas legais sobre o Kettlebell. Vou indicar alguns canais e obras para quem estiver ou vier a se interessar por esta ferramenta.
 
Notas importantes:
 
    • Não recomendo a ninguém bancar o maluco (ou maluca) e sair praticando atividades físicas por conta própria como eu fiz. O melhor - embora nem sempre possível - é procurar ajuda especializada, nem que seja do seu professor ou professora de educação física ou mesmo o treinador da academia ou alguém recomendado por um profissional de saúde se for o caso. Também recomendo que leiam livros sobre o tema e, neste caso, recomendo o livro Treinamento com Kettlebells (que me ajudou bastante também);
    • Não recomendo a ninguém praticar atividade física antes de realizar uma avaliação médica, principalmente se estivermos falando de pessoas com mais idade.
    • Não sou especialista na área e tudo o que eu escrevi acima é fruto da minha visão e experiência de vida pessoal. E escrevi apenas para falar um pouco sobre a minha jornada até conhecer o Kettlebell, ferramenta esta que faço questão de divulgar para os quatro ventos, devido aos vários benefícios que podem promover para a saúde a um custo tão baixo - quando comparado às mensalidades das academias e que às vezes são bastante salgadas.
    • Caso você possua escoliose - como é o meu caso - não se desespere. Aliás, isto vale para qualquer tipo de lesão e/ou condição que atrapalhe a realização de alguma atividade qualquer, seja ela esportiva, recreativa ou mesmo profissional. Sempre há uma forma de superar um obstáculo, nem que seja desviando de seu caminho para encontrar outro caminho, que por mais que longo, o levará através da mesma jornada rumo ao seu objetivo. Saliento ainda que, nestas Olimpíadas de 2016, fiquei bastante espantado - mas não de todo surpreso - ao descobrir que Usain Bolt também possui escoliose. Sim, isso mesmo. Ele possui. Este foi um obstáculo que ele precisou superar para então começar a apresentar resultados no atletismo. Mais uma - entre tantas - provas de que a ciência não é uma área de certezas e por tanto, não deve guiar nossas vidas e escolhas de modo absoluto; mas apenas nos apoiar em nossas escolhas e decisões. Futuramente falarei de outro personagem que ilustra, talvez ainda mais que Bolt, esta superação mediante previsões da medicina e até da ciência de modo geral; falo de Valentin Dikul... Mas, isto é história para outro post.
 
Por hora é isso.

Agradeço a companhia e até a próxima viagem.

Os meus Kettlebells em casa