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"No passado, eu já notara que algumas árvores são barulhentas, seus galhos sempre rangem ou suas folhas farfalham, enquanto outras quase não produzem ruído algum. Lá no alto, eu ouvia o murmúrio distante do vento, mas, na mata, os únicos sons audíveis eram os das nossas botas. Tudo estava muito quieto; uma mata inteira, repleta de árvores tão silenciosas, fez um arrepio subir e descer pela minha espinha. E quase me fez pensar que elas estivessem nos escutando."
— Joseph Delaney (O Aprendiz: As Aventuras do Caça-Feitiço)
Relendo O Aprendiz: As Aventuras do Caça-Feitiço na casa nova
Eu postei recentemente sobre a minha mudança de endereço: do meu apartamento para uma casa. Continuo vivendo na cidade de Oz (Osasco), mas muita coisa já mudou na minha rotina nesses poucos dias. Estou ainda me adaptando às mudanças e a leitura tem me ajudado com isso.
O primeiro livro que peguei para ler na casa nova foi, por algum motivo, O Aprendiz, da séria As Aventuras do Caça-Feitiço. Na verdade, com "ler" eu quero dizer "ler novamente", pois já li esse livro umas duas vezes (a primeira vez que o li, foi para colocar minha filha e minha sobrinha para dormir, e depois foi simplesmente porque gostei da história e quiz revive-la e também "estudá-la"; afinal nós escritores estamos sempre analisando outras obras em busca de inspiração e também em busca de conhecimento, como um marceneiro faria ao analisar a mobilia criada por outro artesão um um serralheiro ao analisar minuciosamente as tecnicas metalúrgicas usadas por um colega de profissão para soldar um portão, etc, etc, etc).Mas o motivo que me levou a querer ler esse livro é um pequeno mistério (eu já estava relendo O Conde de Monte Cristo e poderia ter dado continuidade como já vinha fazendo a alguns meses). Mas, se eu me esforçar um pouco, talvez eu descubra os motivos ocultos da minha decisão irracional com certa facilidade.
Farei esse esforço agora enquanto escreve e relembro desses primeiros dias (na verdade noites) na minha nova morada.
Primeiramente eu deduzo que eu estava em busca de uma leitura fácil, rápida e prazerosa. Eu gosto de como o autor anda com a história de Tom de forma rápida e envolvente.
Segundo, talvez eu sinta alguma simpatia com o personagem do Tom e grande parte dessa simpatia vem do fato de que eu me vejo nele em alguns aspectos:
- Assim como Tomas Ward, eu também comecei a trabalhar cedo no negócio da família, por assim dizer (na verdade comecei a ajudar meu pai entre 7 e 8 anos, exatamene quando ele começou a trabalhar como pedreiro);
- Eu também tinha que andar bastante no meio do mato e no loteamento de casas onde viriamos a morar (e algumas das minhas trilhas eram bastante sombrias: e embora isso não venha ao caso, eu já testemunhei algumas coisas perturbadoras por essas trilhas), pois como o meu pai não tinha carro, nós íamos para todo lado a pé (exatamente como Tom e o Caça-Feitiço), fosse trabalhando na construção da nossa própria casa ou na dos clientes que o meu pai conseguia na região onde floresceu o bairro onde construímos nosso lar (o lugar foi batizado de Jardim 1º de Maio em homenagem ao dia do trabalhador, mas foi integrado recentemente a um bairro maior, o Jardim Santa Maria, que eu já citei inumeras vezes em meu blog);
- Da mesma forma que o Tom precisa carregar a pesada bolsa de seu mestre, eu também tinha que carregar a pesada sacola de ferramentas do meu pai (e às vezes também enxadas, pás e tábuas). E apesar do meu pai não ter me ensinado o seu ofício, acabou me ensinando muita coisa por osmose enquanto me fazia ser seu ajudante de pedreiro.
Esses fatos e também outros, me fazem simpatizar com essa saga de livros e com seu protagonista.
Provavelmente foi essa nostalgia (sentimento raro na minha pessoa, mas não completamente inexistente) que me fez buscar algo que me ligasse ao meu passado e a uma atmosfera familiar, ajudando meu inconsciente a se habituar à casa nova. Ou seja, eu buscava alguma coisa que me fizesse "me sentir em casa", ou pelo menos em um lugar "familiar" e sem perceber com clareza que eu fazia isso, recorri à leitura de um livro conhecido. Claro, eu tinha alguma noção do porque tive vontade de ler esse livro em específico; mas uma "vaga noção" não é o mesmo que "saber com clareza o que se está fazendo".
Foi curioso que, nos primeiros dias eu notei como as árvores em frente da casa nova são "barulhentas". As duas mais próximas da janela do meu quarto (que dá para a rua) são um Ipê Roxo (coincidentemente também há um ipê roxo em frente à janela do meu apartamento) e um chapéu-de-praia. E quando digo que as árvores são barulhentas, me refiro ao som que elas fazem quando venta e, no que diz respeito ao chapéu-de-fraia, ao ruído que seus frutos fazem quando caem sobre as folhas secas do gramado de uma escola em frente à minha janela ou sobre algum carro estacionado na rua e em baixo dela.O fato de eu achar essa árvores "barulhentas" não é uma reclamação. Ao contrário, este é um ótimo sinal; significa que o lugar é suficiente quieto para permitir que eu preste atenção a estes sons.
Eu reparei nisso no domingo à tarde, quando chegava do apartamento com mais uma leve de itens que não couberam no caminhão de mudança.
Qual não foi minha surpresa quando, à noite, enquanto eu lia "O Aprendiz", me deparei com a frase que usei Citei no início desse Post. Quiz fazer esse Quote para guardar a lembrança dessa agradável coincidência.
Alguns dias antes eu tive uma experiência parecida na casa nova (acho que foi na segunda noite em que dormi lá); enquanto eu lia o capítulo 3 "Rua Alagada nº 13". Nesse capítulo Tom houve o som do sino da igreja tocando (o que vai ser de muita utilidade para ele durante o teste a que seu mestre o submeteu) e durante a leitura dessa passagem eu mesmo escutei o sino da catedral próxima de casa tocando (a Catedral de Santo Antônio).